CEO da agência Publicis Brasil fala para a Trinova sobre sua trajetória e previsões para o mercado de comunicação.
Quando falamos em publicidade, logo vem à cabeça grandes campanhas que marcaram nossas vidas, seja pelo jingle chiclete que grudou na memória, um slogan marcante ou comercial. Mas antes da criação final nos saltar aos olhos, existe um caminho bem longo a ser percorrido, de negócios, planejamento, estratégia. Foi por esse caminho que Eduardo Lorenzi se apaixonou e se descobriu como publicitário. Os 4Ps da publicidade (Produto, Preço, Praça e Promoção) ele aprendeu aos 13 anos com o pai, que sempre foi do ramo de marketing. Hoje, Lorenzi é CEO da Publicis Brasil, agência de São Paulo que faz parte do Publicis Groupe, holding francesa que é um dos três maiores hubs de comunicação do mundo.
Depois que ouviu do pai sobre os fundamentos do marketing, Lorenzi se preparou durante toda a vida para trabalhar na área de criação. Como de costume, a graduação em publicidade tirou um pouco das suas certezas. No terceiro ano da faculdade descobriu que gostava da criatividade, mas não da criação em si e mergulhou para além dos trabalhos criativos, rumando para o planejamento.
Iniciou sua carreira na Talent (hoje Talent Marcel) há 22 anos tendo como mentor, nada mais, nada menos, do que Julio Ribeiro, um dos nomes mais importantes da história do mercado de publicidade brasileiro. Entrou na agência como assistente e subiu de cargo até virar diretor de planejamento. Em seguida, foi para a Neogama/BBH (rede de origem inglesa), onde passou 10 anos atuando como head de planejamento até se tornar sócio da agência.
Lorenzi foi eleito profissional de Planejamento do Ano pela APP (Associação dos Profissionais de Propaganda) em 2013 e foi duas vezes indicado ao mesmo título pelo Caboré, em 2011 e 2015. Na Publicis Brasil, Lorenzi atuou como VP de Planejamento por três anos. No final de 2017 o publicitário começou a dividir a presidência com Miriam Shirley e, em fevereiro de 2019, assumiu o cargo de CEO da agência, que atualmente conta com 400 colaboradores.
O CEO recebeu a Trinova na Publicis Brasil para uma conversa sobre mercado e os desafios da comunicação. Confira a entrevista:
TRINOVA – Antes de se tornar CEO da Publicis Brasil, você dividiu a presidência com Miriam Shirley. Como avalia esses dois modelos de gestão?
EDUARDO LORENZI – No mercado de agências é muito comum casos de copresidência. Não existe um modelo certo e errado, são estratégias diferentes de gestão. Existe aquela frase: “se você quer ir mais rápido, vá sozinho, mas se quer ir mais longe, vá junto.” Então, sozinho dá para tomar decisões mais rápidas e seguir só uma linha de pensamento. Já em um modelo de copresidência, discute-se muito mais cada questão e tem sempre um segundo ponto de vista. Na copresidência também tem o conforto de dividir a responsabilidade. Dá para correr mais rápido sozinho, porém existem mais riscos.
TRINOVA –Em 2018 o Facebook lançou de forma silenciosa uma revista impressa em Londres. No mesmo ano, a Amazon inaugurou lojas físicas, a Amazon Go. Qual sua visão sobre essas movimentações de produtos digitais abrangendo para meios tradicionais?
EDUARDO LORENZI – As pessoas no mercado de publicidade gostam de ser apocalípticas, de falar que com a chegada de mudanças, as coisas antigas serão deixadas de lado. Mas se observarmos a longo prazo e olharmos os dados com calma, veremos que nenhum meio de comunicação morreu depois da internet. Os meios tiveram uma redistribuição de verba, de conteúdo e relevância, mas mesmo com todo o crescimento digital ainda existem jornais, revistas e canais de TV aberta. Existe obviamente a diferença de distribuição de recurso. Mas a longo prazo tudo se complementa.
As métricas, inclusive, estão mudando porque antigamente o digital era focado em quantidade de likes, compartilhamentos, fãs na página do Facebook e agora elas são analisadas de uma forma mais completa, vendo quanto de público vai até a loja, número de vendas. No fim, o digital faz parte de um composto de meios que são usados para uma marca atingir seu objetivo e comunicar o que ela quer comunicar.
TRINOVA –Qual sua opinião sobre as mídias tradicionais?
EDUARDO LORENZI – Obviamente crescemos no digital pois acompanhamos o que acontece com as audiências. Temos que ser técnicos nesse quesito. De toda a verba dos clientes da Publicis Brasil em 2019 vamos fechar com 30% de investimento no digital. Em 2018 foi 20% da verba para o digital. Mas tem uma série de clientes que ainda precisa de meios tradicionais para atingir seu público. O digital ainda não dá conta de tudo. Várias empresas nativas digitais, que nasceram fazendo trabalho de mídia de performance, de criatividade dinâmica, atingiram sua performance limite e chega uma hora que precisam do meio tradicional. Para ampliar a base, aumenta-se a boca do funil com a mídia em massa.
TRINOVA –Estamos na era da informação, somos bombardeados de novos conteúdos a todo momento. Então, como criar uma propaganda emblemática, que prende a atenção do público?
EDUARDO LORENZI – Existem alguns pontos. O primeiro é que você precisa de dados. Hoje em dia temos muitos dados disponíveis e muito no que nos basear para atingir um público, para criar a mensagem que faça sentido para aquela pessoa no momento e local que ela quer receber. Quando você tiver essa quantidade de dados – pessoa, mensagem, local e hora – não vai ser só mais um conteúdo que entra para atrapalhar, vai ter relevância. O segundo ponto é ter a consciência de que tudo que se faz de planejamento mídia ou tem que trabalhar junto com dados, não existe mais pontos totalmente soltos. A criatividade é solta, mas ela tem que estar a serviço do objetivo de negócio e direcionada para um público específico.
TRINOVA –Tambémestamos na era dos digitais influencers. Acredita que essa nova profissão é aliada das agências de publicidade?
EDUARDO LORENZI – Os digitais influencers são mais uma ferramenta que temos para usar para construir uma marca, são mais um canal de comunicação. Antigamente os comunicadores faziam muito sucesso em canais de massa e a gente no máximo conseguia estar na borda desses programas fazendo inserção publicitária ou merchan no meio do programa.
Com os influencers duas coisas mudaram: conseguimos atingir públicos bem específicos que são fiéis aquela pessoa, e acabou a história de que um conteúdo só vai ser bom se for feito 100% pela agência. Isso não existe. A agência não vai dar conta de tudo, nunca vai conhecer todos formatos que os veículos digitais têm porque eles estão mudando o tempo todo. Temos que integrar na nossa solução muitas parcerias. Tem projetos da Publicis que desenvolvemos junto com o Google, Facebook, a área de conteúdo da Globo, e muitos com creators influencers porque também não podemos impor para a pessoa algo que não tem a ver com a personalidade dela.
TRINOVA –Usa-se muito a expressão “pensar fora da caixa” na publicidade. Para você, o que é pensar fora da caixa no momento da criação?
EDUARDO LORENZI – O pensar fora da caixa para mim é parar de pensar criatividade por formato. Exemplo: criar um filme pra TV, um para stories, uma peça triangular para revista. Para mim isso são caixas.
A forma que a gente pensa criatividade na Publicis Brasil é diferente, dividimos ela em três tipos: criação de histórias, experiências ou inovação. História de marca é algo que a marca quer contar para as pessoas e o formato que isso vai ser divulgado é definido depois. A experiência é quando as pessoas vão poder interagir com a marca (evento, ativação, sampling). Por último, a inovação, que não é história nem experiência, mas é alguma coisa que a marca traz de novidade, seja uma prestação de serviço ou projeto novo. Depois que definimos entre esses três tipos, vemos o formato de acordo com a verba do cliente.
TRINOVA –Como é o seu olhar para a questão de igualdade de gênero e raça dentro do quadro de funcionários da Publicis Brasil e na estratégia de comunicação?
EDUARDO LORENZI – Dentro da Publicis existe há mais de três anos um comitê de diversidade que se reúne para levantar essas questões, discute acontecimentos internos e traz palestrantes para falar para agência toda e trazer conhecimento, repertório e empatia para uma série de grupos que muitas vezes são sub-representados pelo quadro de funcionários. Isso vem mudando muita coisa aqui dentro.
Anos atrás também decidimos ter um grande foco no equilíbrio de gênero no quadro de funcionários. Hoje a Publicis tem cerca de 50% homens e 50% mulheres. Em cargos de lideranças as mulheres ocupam 56%. Passamos a ter também um segundo foco na questão de raça. De dois anos para cá a presença de negros aumentou no quadro de funcionários de 8% a 21% e a nossa meta é chegar a 30% até daqui um ano e meio porque essa é a composição da população de São Paulo, então queremos ter um quadro de funcionários que represente o local que estamos inseridos.
Algumas questões de diversidade para mim não fazem sentido do jeito que muitas vezes são abordadas. No Brasil existem muitos grupos chamados de minoria, mas que, na verdade, são maioria na população como mulheres, por exemplo. Aqui buscamos a realidade e não a diversidade.
TRINOVA – Neste ano a Publicis Brasil levou os principais prêmios do mercado, foram 48 no total. Qual o segredo para esse número expressivo de prêmios que a agência arremata pelo mundo?
EDUARDO LORENZI – Importante dizer que prêmios, para gente, são consequências, e não objetivo. Os prêmios que ganhamos não são de campanha fantasma, que não existiram. Ganhamos sempre com campanhas reais, que muita gente viu no ar e foram premiadas pela qualidade. Foram muitos prêmios esse ano porque passamos a ter insights muito fortes para criar. Criamos na Publicis o BrainLab, que é a junção de áreas da inteligência que antigamente ficavam separadas. A relevância ficou muito mais assertiva.
TRINOVA – Qual o maior case de sucesso da sua carreira e também na Publicis Brasil em 2019?
EDUARDO LORENZI – Da minha carreira foram vários, não consigo citar apenas um. Na Neogama/BBH teve a campanha do “Bradesco Completo” e a da Tim “Você sem fronteiras” com o Blue Man Group. Todas da Talent me marcaram muito, entre elas marcas como Tigre, Ipiranga e Estadão.
Na Publicis tem uma série de coisas que gosto muito de diversos clientes. Com o Bradesco tivemos a campanha da BIA, que hoje é a inteligência artificial mais lembrada do Brasil. Para a Sanofi criamos campanhas para Dorflex e Novalgina. Para Novalgina, que super é ligada a cuidado, fizemos uma campanha sobre o poder do colo e com o Dorflex subvertemos a lógica da comunicação de analgésicos, que sempre segue a lógica de dor e alívio, e propusemos aproveitar a vida para depois se preocupar com a consequência, por exemplo, você curte o Carnaval e depois vem a dor.
No Dia das Mães criamos para a Ninho uma campanha que fala das escolhas difíceis que mães têm que fazer para os filhos e foi bacana que ela circulou fora do nosso mercado e foi bastante compartilhada em grupos do WhatsApp. Aconteceu algo muito legal com Ariel, criamos a campanha “Compartilhar Nos Faz Melhores” sobre divisão de tarefas domésticas e ela acabou ganhando o prêmio da ONU Mulheres – De Igual a igual por promover a igualdade de gênero.
Para o nosso novo cliente, a Honda Motos, abordamos o que move as pessoas na campanha “O Que Move Você Move a Honda”. Também reposicionamos o Carrefour como uma empresa que não só vende produtos, mas também se preocupa com a alimentação das famílias e realizamos a primeira campanha do Senac totalmente digital, no Twitter.
TRINOVA – Como foi 2019 em relação ao mercado e quais as suas perspectivas para 2020?
EDUARDO LORENZI – 2019 foi um ano difícil. Em 2018 o Brasil passou praticamente metade do ano travado em uma discussão política sobre eleições e, mesmo com o resultado definido, a polarização continuou. Uma série de investimentos que achávamos que ia destravar demorou para acontecer. Havia a expectativa de que várias reformas aconteceriam também, mas elas não ocorreram. Mas tivemos avanço com a aprovação da reforma da Previdência e isso gera confiança de investimentos voltarem. Então, em 2020, com essa reforma aprovada e outras que o Governo está prevendo para o primeiro semestre, devemos ter um retorno de investimentos. Tem muito empresário apreensivo que vai voltar a investir. Não podemos ficar esperando para sempre.
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