Ela prova que a causa sustentável gera lucro para os milionários

por | 27 mar, 2020 | 0 Comentários

Ativista e empreendedora, Marina Cançado defende que investimentos de impacto são cruciais para o desenvolvimento sustentável do planeta.

As questões climáticas e de desigualdade social são os maiores desafios da Agenda 2030 da ONU (Organizações das Nações Unidas). A Agenda traça um plano de ação para cumprir objetivos globais para o desenvolvimento sustentável do planeta até a próxima década. E, acredite, há muito trabalho a ser feito, principalmente no Brasil, um país em pleno desenvolvimento. Um levantamento da Rede Global de Investimentos de Impacto apontou que são necessários US$ 2,5 trilhões por ano para que os países em desenvolvimento avancem em suas metas para o bem-estar desta e da geração futura.

Fica claro que, para a resolução destes desafios, os recursos filantrópicos e governamentais não são suficientes. Torna-se necessário o direcionamento de capital do setor privado, por meio de empresas e do mercado financeiro. Esse estalo chegou para Marina Cançado há mais de uma década. Ativista e empreendedora, ela integra a quarta geração da família fundadora da rede de farmácias Drogal e, aos 31 anos, é protagonista do engajamento de jovens líderes para um futuro melhor e se dedica para propagar o conceito de investimento de impacto com famílias empresárias brasileiras.

Não conhece o termo investimento de impacto? A Marina te explica o conceito: “Investimentos de impacto são aqueles que geram retorno financeiro e, ao mesmo tempo, geram impacto social e ambiental positivos. Por exemplo, investir em uma empresa de painéis solares que está contribuindo para energia mais limpa, ou em tecnologias de baixo custo que façam exames preventivos em populações de baixa renda. Estes exemplos poderiam ser considerados investimentos de impacto.”

Formada em administração pela FGV (Fundação Getúlio Vargas), com pós-graduação na Universidade de Georgetown, em Washington (EUA), e especializações em outras universidades de renome como Stanford e Instituto de Tecnologia de Massachusetts, Marina percebeu desde muito jovem que um dos elementos que trava o desenvolvimento do Brasil é a falta de engajamento das grandes famílias empresárias com os desafios do país.

“Tudo o que eu faço é para que os investimentos fomentem soluções para resolver as desigualdades e questões climáticas, que são os entraves da década. Se não resolvermos esses pontos, nossa sobrevivência enquanto humanidade corre risco. O Brasil é carente de uma elite de fato. Quando digo elite, me refiro não só às pessoas que têm recursos financeiros, mas àquelas que têm uma visão de futuro e coordenam suas redes para um projeto de país a longo prazo”, explica.

Marina começou a carreira ajudando famílias empresárias de relevância nacional a direcionarem suas filantropias para ações que resolvam questões estruturantes do país. Atualmente, ela presta assessoria para grandes famílias empresárias milionárias e multimilionárias sobre a readequação de seus portfólios de investimento, alinhando-os às causas que o grupo se preocupa em relação ao futuro.

“É preciso extinguir a ideia de que a única forma de fazer o bem é pela filantropia. Aos poucos, o mundo dos negócios e o mercado estão entendendo que é possível investir para ganhar dinheiro e, ao mesmo tempo, ajudar o próximo e o país”, provoca.

O olhar de Marina alçou grandes voos. Em 2018, ela apareceu na lista Forbes Under 30, que aponta jovens de até 30 anos que estão fazendo a diferença em diferentes áreas.

Atuação engajada

Desde que Marina Cançado percebeu seu poder de transformação no coletivo, não cessou seu trabalho em prol da disseminação de sua missão. Ela trabalhou e chegou a coordenar o programa de formação para jovens herdeiros ministrado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o “Legado para a Juventude Brasileira”. No projeto, se aprofundou com mais de 400 jovens de famílias de todo o país sobre o papel de todos em relação ao Brasil. Em 2018, Henrique Cardoso lançou o livro “Legado para a Juventude Brasileira: Reflexões sobre um Brasil do qual se Orgulhar” e Marina assinou um dos capítulos.

A empreendedora é uma das fundadoras e coordena a associação Agenda Brasil do Futuro, um grupo de jovens de famílias empresárias que se uniram para criar uma plataforma de investimentos de projetos estratégicos para o Brasil.

Ela fez parte do Conselho da Presidência da República no mandato de Michel Temer. Além disso, durante três anos, Marina coordenou o desenvolvimento do programa de educação financeira para beneficiários do programa Bolsa Família, o que a fez rodar o Brasil e entrar em contato com a realidade das famílias em situação de pobreza e extrema pobreza, com o intuito de ajudá-las a organizar o uso dos seus recursos. Depois de avaliações externas comprovarem a efetividade das soluções propostas na redução de dívida e no aumento de poupança dessas famílias, o programa de educação financeira “Futuro na Mão” tornou-se parte integrante do Programa Bolsa Família e já é oferecido em centenas de municípios brasileiros.

Atualmente, uma das frentes de atuação da ativista é na The Impact, rede global que trabalha para que o mercado financeiro se transforme ao criar produtos que integrem as dimensões sociais do mundo aos investimentos de famílias ultrarricas. Justin Rockfeller, tataraneto do magnata do petróleo John D. Rockfeller, é cofundador do grupo.

Investimento de impacto

Em 2019, Marina percebeu que, depois de 10 anos de trabalho, precisava atuar fortemente no capital privado. “Sei que eu fiz muita diferença nos projetos que realizei com filantropia nas grandes famílias, mas, até então, tinha mexido com 1% do patrimônio delas. Diante dos desafios da próxima década, não tem mais como ficar em 1%. O capital privado, seja no formato de empresa ou mercado financeiro, precisa estar mais alinhado com o futuro que a gente quer construir”, disse.

Com o propósito de trazer mais consciência às famílias sobre investimento de impacto, Marina idealizou a Converge Capital Conference, que teve sua primeira edição em fevereiro, no Rio de Janeiro. O evento reuniu grandes investidores e principais atores do mercado financeiro brasileiro para discutir sobre portfólios de investimentos que gerem retorno financeiro e impacto positivo em questões sociais e ambientais.

A conferência de dois dias teve palestras e painéis com cerca de 100 autoridades no assunto, como Uri Levine, cofundador do Waze; Gerd Leonhard, um dos mais influentes futuristas do mundo; Sam Bonsey, diretor-executivo do The Impact; Silvio Dulinsky, representante do Word Economic Forum para a América Latina; Natalie Klein, herdeira das Casas Bahia e fundadora da Nk Multimarcas; o climatologista Carlos Nobre; e Katyna Argueta, residente do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento).

Essa nova visão do mercado financeiro, segundo Marina, é necessária para atender a demanda da nova geração, que tem uma responsabilidade social mais apurada do que a geração anterior.

“Investidores querem cada vez mais investir em empresas mais sustentáveis. Inclusive, isso diminui riscos. Por exemplo, quando ocorreu o desastre ambiental em Minas Gerais, com a Vale, esses riscos não estavam contabilizados no preço da ação da empresa. Quando o rompimento da barreira ocorreu, todo o mercado financeiro teve que começar a considerar isso. Pensar em sustentabilidade no mercado financeiro é uma forma de minimizar riscos, de entender que empresa será mais lucrativa a longo prazo porque está seguindo a tendência do mundo”, comenta.

Marina espera que as pessoas e o mercado entendam que o capital é uma ferramenta para mudar o mundo, e garante que vai continuar trabalhando incansavelmente para que o mundo ouça seu apelo.

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